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Curiosidades

O que as fadas ensinam

Quanto vale uma boa história? Segundo os psicanalistas Diana Lichtenstein Corso e Mário Corso, autores de Fadas no divã – Psicanálise nas histórias infantis, vivenciar situações imaginadas por outros ajuda a pensar a própria existência sob diferentes pontos de vista. “Habitar essas vidas de fantasia é uma forma de refletir sobre destinos possíveis e cotejá-los com o nosso. Às vezes, uma história ilustra temores de que padecemos; outras, encarna ideais ou desejos que nutrimos; em certas ocasiões, ilumina cantos obscuros do nosso ser. O certo é que escolhemos aqueles enredos que nos falam de perto.”

No livro, os escritores partem da apreciação de textos clássicos e contemporâneos da literatura infantil para debater questões relevantes da infância. Incluem de contos consagrados que encantam gerações sucessivas há séculos, como O patinho feio, João e Maria, Chapeuzinho Vermelho, Rapunzel e A bela e a fera, a obras mais atuais, desde Peter Pan e O mágico de Oz até Mafalda, Calvin e A turma da Mônica, entre outros. O drama do patinho feio, que nasce com a aparência diferente da dos irmãos, por exemplo, elucida os conflitos desencadeados pela chegada de um bebê na família e as dificuldades que ele enfrenta para encontrar seu lugar no mundo. Já os quadrinhos do garoto Calvin e seu tigre de pelúcia permitem conjecturas sobre o amigo imaginário que algumas crianças “adotam”, uma espécie de alter ego, como explicam os autores.

Para Harry Potter, o bruxinho criado por J. K. Rowling, que conquistou fãs em todo o planeta, foi dedicado um capítulo inteiro – Uma escola mágica. De carona na famosa trama, são tratados tópicos inerentes à infância moderna: expansão do papel da escola na socialização, negação do passado e obsessão pelo futuro, puberdade, cisão da figura paterna etc. “Ao investigar o significado de Harry Potter, abre-se uma porta para estudar a vida e o pensamento das crianças de nosso tempo”, observam os psicanalistas, atentando para um aspecto interessante do sucesso alcançado pela série: “Harry Potter revelou uma massa de crianças leitoras”.

Desamparo, rejeição pela família, distúrbios alimentares, curiosidade sexual e passagem da infância para a adolescência são apenas mais alguns dos temas enfocados. A visão psicanalítica lançada sobre as histórias para pequenos leitores segue o caminho traçado anteriormente pelo psicanalista austríaco Bruno Bettelheim em A psicanálise dos contos de fadas, que fez uma análise psicológica de como muitas dessas histórias repercutem na infância e por que permanecem vivas na lembrança.

Fadas no divã confirma a relevância de estimular o contato das crianças com o mundo da fantasia. “Histórias são como exemplos, metáforas que ilustram diferentes modos de pensar e ver a realidade e, quanto mais variadas e extraordinárias forem as situações que elas contam, mais se ampliará a gama de abordagens possíveis para os problemas que nos afligem. Um grande acervo de narrativas é como uma boa caixa de ferramentas, na qual sempre temos o instrumento certo para a operação necessária.” Os psicanalistas acreditam que, de modo intuitivo, a garotada sabe disso: “A criança é garimpeira, está sempre buscando pepitas no meio do cascalho numeroso que lhe é servido pela vida.”