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Curiosidades

O que você diria sobre o silêncio?

"Silêncio evoca paz, tranqüilidade, por um lado, e evoca também a idéia da vastidão do universo. (...) Você, no silêncio, pode descobrir coisas que ainda não tinha pensado ou percebido. Sem dúvida, é positivo não só para a saúde como para a poesia e para a arte.”

As reflexões são do poeta Ferreira Gullar, um dos 15 entrevistados da fonoaudióloga e especialista em eutonia (percepção e consciência corporal) Andréa Bomfim Perdigão  em Sobre o silêncio.  No livro, ela apresenta os pontos de vista de profissionais de diversas áreas – artes, medicina, física e sociologia, entre outras –, priorizando o lado  humano  e  não  o  científico  do  assunto.  Seu  intuito, conforme explica, não foi obter uma pesquisa conclusiva, mas mostrar, por meio de uma seqüência de conversas, diferentes caminhos para se lidar com o tema.

Psicólogo e eutonista, Gilberto Safra (de quem a autora foi aluna e cujas aulas eram “repletas de pausas para que as falas e as escutas se acomodassem”) considera que o silêncio é o estado mais necessitado e, na maior parte das vezes, o mais temido. É a possibilidade que o indivíduo tem de estar posto em si e na vida, desprendendo-se de tudo aquilo que o define social e psicologicamente.

Para o psiquiatra Marco Antonio Spinelli o excesso de estímulos, num mundo onde “há sempre uma barulheira”, é fator desencadeante de distúrbios como o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade e o transtorno bipolar. “Nossa sociedade hipertécnica e hiperexcitada multiplica esses e outros quadros psiquiátricos.” A fisioterapeuta e eutonista Maria Thereza Feitosa, por sua vez, ressalta a importância de silenciar para buscar ouvir o próprio corpo. “Essa qualidade de contato faz você habitar o seu espaço interno de maneira dinâmica”, diz ela, sugerindo também uma atenção ativa: “Ver como é o seu corpo, essas possibilidades de correção, de cura que o próprio sistema oferece.”

Sob nova perspectiva, a atriz Fernanda Montenegro afirma que o silêncio só existe na morte. A pulsação da vida é sonora e o diálogo interior e as emoções podem ser mais barulhentos do que o pseudo-silêncio daquele que decide não falar. “Não há nada mais tonitruante do que o chamado silêncio”, enfatiza. “O fato é não confundir ou escamotear o grande som do silêncio interior com os ruídos do cotidiano.”

Em meio aos instigantes depoimentos, a socióloga Flávia Schilling, que esteve confinada como presa política durante sete anos e meio, relata sua “experiência de silenciamentos” e como a leitura foi importante nesse período, permitindo manter seu universo povoado. E a fonoaudióloga Beatriz Novaes fala de sua experiência com crianças deficientes auditivas, levantando questões como a capacidade humana de dar destaque aos sons que importam e silenciar o que não interessa.

As diferentes visões expostas no livro confirmam uma das ponderações feitas pelo cantor e compositor Arnaldo Antunes: “Eu entendo o silêncio como uma coisa plural; não existe um único, existem vários.” O silêncio, a seu ver, pode ser pensado de várias maneiras – carregado de significados, vazio de sentido, como ausência de som ou intervalo entre sons, como incapacidade de dizer... O que não há é o silêncio absoluto. Mesmo no mais completo isolamento, ainda é possível escutar o pulsar do coração.